quinta-feira, 19 de junho de 2008

quietude

Já estava acostumado com o silêncio do pai, não se tratava de uma quietude plana, rasa; era como se várias palavras flutuassem entre seus corpos, anulando-se. Não foi bem um som vocal que cortou a monotomia (não tão monotomia) no carro, lá fora uma moto passava buzinando, driblando o gol azul claro, quase cinza (antes azul marinho tão forte, antes tão certo). O pai vela estourada, chama sempre forte e quase nunca aberto, pressionou o pé direito e cegou o carro. E cegou o filho também, que estava ao seu lado, quieto, gesticulando com as mãos tudo que não conseguia dizer. Cruzaram o asfalto cinza com faixas amarelas, a moto mais rápida, mais sinuante, mais desconfortável. Pai não desistia, perdeu a cabeça, ele pensava, por que ele sempre perdia a cabeça? Fechou os olhos para não ver nada, desistiu, a quietude é assim, tornou a abrir esporadicamente, pode ver o desespero da moto, cruzando o sinal vermelho, mas não viu (pois fechou os olhos na hora, como uma criança idiota e com medo) o caminhão atravessando a carne, atravessando as ferrugens, manchando o asfalto.

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