quarta-feira, 30 de novembro de 2011

No final do dia



Agora escapa dessa.

Que eu já contei mais de um milhão de vezes.


É quase como se fosse sempre igual.


Não podemos ser rudes e nem tocar; não podemos pensar no que já foi dito.

Meu corpo nem fala mais porque nem há nada mais para dizer.


É só jogar tudo fora.

De novo.

No final do dia.


Repete como quem sonha com desejos,

Destila veneno, por favor.

Ajuda a compor em mim o que nem lembro.


Antes de a noite chegar, cansada.

Antes de o beijo acalmar o pensamento.


E tudo fingir que fica normal, mas só por um tempo. 

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

ok?


Não é sobre almas gêmeas, ou simplesmente sobre como mulheres podem ser malucas.

E como homens podem ser imbecis às vezes, ou muitas vezes.

Não é sobre cores de cabelo, 

sobre crise de identidade

pós-moderna, ou coisa do tipo.


Nem sobre dor,

lembrança do que poderia ser, ou do que não foi.

Não é sobre querer pular fora e não é sobre querer ficar.


É aceitação,

é a mais pura aceitação:

tão sofrida, 

tão difícil.


terça-feira, 1 de novembro de 2011

Os videogames, eu e um tcc



         Comecei a me perguntar porque escolhi o tema videogames para o meu trabalho de conclusão de curso. Não que eu nunca tenha pensado nisso, mas resolvi ir mais afundo para tentar entender o porquê de estar pesquisando tal assunto e o que me interessa mais nele.  Antes de tudo, meu trabalho não é precisamente sobre videogames, é sim sobre a cobertura dos games pela subeditoria de VideoGames localizada na editoria de Arts do Nytimes.com. O que me deixou curioso e feliz desde que descobri esse fato é que os videogames estavam finalmente sendo tratados como uma manifestação cultural e que o conteúdo não reproduzia aquele olhar preconceituoso ou aquele olhar de descoberta ( como se os games tivessem nascido ontem) – ambos muito comum quando a mídia não-especializada aborda o assunto.



Editoria de Videogames do NyTimes.com


Aliás, fiquei curioso e empolgado também porque era o The New York Times, afinal de contas, um dos maiores e mais tradicionais jornais do mundo. Finalmente, a grande mídia passava a valorizar os jogos digitais (adotando aqui o termo utilizado por Cristiano Max na sua tese de doutorado). É claro que há todo o interesse econômico em torno dos games, vendem cada vez mais e se mantém no topo da cadeia quanto à margem de lucro – em relação ao cinema, música, etc. Mas isso há em todas as áreas, e não é porque os games nasceram de uma evolução tecnológica e estão inseridos em um sistema que visa o lucro que eles não tem valor, ou não merecem uma cobertura semelhante a outros produtos culturais.

            Enfim, esse não é o foco do texto, gostaria aqui de falar mais sobre a minha escolha: É claro que há o interesse pessoal, poderia passar um tempo aqui dizendo que os videogames me trazem memórias boas, de integração com os amigos, com o meu pai, etc. E que eu jogo há muito tempo e acompanho direto o que acontece no setor. Mas o que sempre me puxou para os games foi essa possibilidade maluca de entrar em contato com um outro mundo e poder interagir com ele, mais de perto. Se perder, nem que seja por um tempo, em outro lugar com outras regras, com outra história, com outras razões. Essa maluquice lúdica interativa que só os videogames podem fazer e fazem, cada vez mais, de uma forma atrativa e interessante. A partir disso, percebo que há muita, muita coisa ainda para se explorar nesse mundo dos jogos digitais, tanto para quem produz e concebe o jogo (o gamedesigner), como para o jornalista que cobre o assunto.

            O que me leva a outro fator, dessa vez mais jornalístico, de ter escolhido esse tema: há muitas barreiras a quebrar ainda, quando se fala sobre videogames. Os velhos esquemas continuam, aqueles clássicos de que os jogos influenciam as pessoas a cometerem assassinatos, que eles são apenas para crianças, que não passam apenas de uma forma pura de entretenimento, banal. Bom, não é bem assim, ou melhor, não é nada assim. Há toda uma história por trás disso, todo um universo que merece ser respeitado e apresentado para a sociedade. Por isso é tão importante o The New York Times cobrir videogames periodicamente, de ter uma seção dentro da editoria de Arts. Dizer assim pode parecer pouco, mas não, não é. É uma espécie de legitimação para um assunto que apesar de ser muito popular, fica à margem de outras manifestações culturais – muitas vezes, por puro preconceito ou desconhecimento. Entretanto, em um mundo em que cada vez se joga mais, e que as pessoas estão se acostumando com o fato de jogar o seu Angry Birds no seu Iphone ou smartphone, e ainda os jogos sociais como o FarmVille ou o The Sims Social nas redes sociais é cada vez mais natural o assunto videogames surgir. E sim vai surgir do nada em uma roda de conversa, em textos na internet, na escola, no seu trabalho, no trabalho do seu amigo, no barzinho, em conversas triviais do ônibus. “Como vai a sua colheita feliz?”, “Preciso que você me ajude conseguir mais dinheiro para aquela nova cerca”.

            Daí , meu amigo, não adianta você torcer o nariz, porque todo mundo já está contaminado. Os videogames, os jogos digitais, os jogos sociais, bom, eles já são realidade - e há  tempo.


domingo, 30 de outubro de 2011

Final


Bem, estou escrevendo o TCC e ando com algum problema de concentração. Porém, com o passar do tempo, notei que não é só por causa do trabalho de conclusão de curso: trata-se de algo maior.

Obviamente, sempre é algo maior. Em um contexto mais amplo acredito que estou condicionado e preso ao computador. Sim, eu sei que é verdade que todos nós estamos, pois, invariavelmente, dependemos dele para trabalhar, seja você jornalista, advogado, médico, engenheiro, etc. Estou dependente dele nesse momento também para escrever o felizardo trabalho e para escrever esse post no blog.

Então, com certeza, deve ser um problema maior do que estar apenas condicionado ao computador. Meu problema superficial tem nome: rede social. Facebook anda me atrapalhando muito, twitter também. É claro que eles não são a razão principal pela qual não consigo me concentrar, mas, com certeza, eles ajudam a piorar o meu foco ultimamente. Criou se uma necessidade em mim de precisar ver o que as pessoas estão compartilhando, ou comentando. E a partir disso criar um julgamento sobre aquilo que elas estão falando e que não vai interferir em nada na minha vida ou na deles. Por vezes, acabo ficando indignado por alguma coisa que se fala/compartilha e etc. E isso ajuda a me atrapalhar e a tirar totalmente aquele fator da concentração. Também se criou em mim a necessidade de compartilhar para os meus “amigos” coisas que eu ache interessante, como se fossem legitimar ou como se passassem a ser real depois da publicação.

Você deve estar achando que estou exagerando, ou que “ele passa tempo demais no Facebook e no twitter e leva a sério demais essas coisas”. Bom, você provavelmente está certo. Uma vez que você participa de uma rede social, você está se representando lá, de certa forma. E tem que estar consciente de suas ações também. Então, é claro que eu levo a sério o que eu posto, ou o que as pessoas postam por lá. É um reflexo da nossa realidade.

Só sei que eu cansei e preciso realmente me concentrar para acabar bem esse TCC. Então estou saindo aos poucos dessas redes sociais – principalmente nesses próximos 20 dias que faltam para a entrega do trabalho de conclusão. Afastando-me das duas, ainda que haja um grupo da formatura no Facebook, o que vou ter que visualizar pelo menos uma vez por dia para ver se há alguma novidade quanto a cerimônia em fevereiro.

É engraçado como essas coisas são, sinto-me meio ridículo ao ter que fazer isso, mas é o que acho melhor para o momento. Sinto falta de escrever para o blog também. Mas em breve, muito em breve, retomaremos.


quinta-feira, 13 de outubro de 2011

estruturado


      Um poema não se constrói sozinho:
é feito de um pouco de mentira e de
alguém que sinta sem sentir e não se
importe com os alheios;
também precisa de um quem que tente entender o que
não precisa se entender e que vai tentar explicar
para outro alguém que nem se perguntou nada.


      Só assim começa a se formar aquilo
que uns vão chamar de poesia, outros de poemas,
outros de “apenas algumas coisas fazem sentido”;
são palavras rimadas ou sem afeto, 
mas, ainda, amarradas tão fragilmente
que, por qualquer besteira, apenas, podem quebrar
ou, muito mais dificilmente, ficarem infinitas.




terça-feira, 11 de outubro de 2011

fechar os olhos


Saiu de cima da bicicleta para o chão com apenas um pulo. Puxou as calças para cima, levou a mão à testa, a fim de limpar o suor, e largou a bicicleta no muro mais próximo. Agora esperava os outros chegarem. Foi o mais rápido. Contou o tempo: levou apenas 25 minutos de casa ao parque. O trânsito não atrapalhou em nada, afinal era um sábado à tarde de fevereiro. Maioria das pessoas naquele momento deveria estar na praia, banhando-se no mar. Se pudesse, ele estaria na praia também, deixando o sol torrá-lo lentamente. Não que o sol da cidade não o torrasse, mas obviamente tudo parece um pouco melhor com areia nos pés. Do nada, a bicicleta perde o apoio e cai no chão, o barulho é abafado pela pouca grama que tenta crescer no chão arenoso. Prateada assim no chão, solta, parada, ele resolve se juntar a ela. Deitar seria bom para descansar enquanto os outros não chegam. Deitar e aproveitar a nuvem que tapa a luz e fechar os olhos só por um instante. E só por um pouco de tempo dormir, enquanto a luz não chega para nos acordar novamente. 

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Quem te viu, te vê quem



Elaine, esses dias eu pensei, o que aconteceria se tivesse dado certo com a gente? Pensei, fiquei matutando na minha cabeça algumas horas, daí cheguei a conclusão que se a gente tivesse ficado junto, muita coisa poderia ter acontecido. Sim, é uma contestação óbvia, eu sei, mas também temerosa. Há muita possibilidade nisso. E é exatamente isso que me incomoda. Eu gostaria de ter a sensação de que se a gente tivesse ficado junto – se não tivesse acontecido todas essas coisas que aconteceram entre nós –, eu realmente gostaria de ter a sensação de que seria uma merda. Mas não sinto isso, o que eu sinto me instiga. E isso é uma droga, porque Elaine, se você ainda me conhece, sabe que eu sou um cara curioso pra caralho. Então o que teria acontecido com nós? Estaríamos casados? Separados? Teríamos filhos, prestações de contas, um apartamento, uma vida?

Pelo jeito você ainda joga o cabelo para trás quando fica nervosa...Desde quando ele ficou vermelho? Tanto faz...Há muito na suposição que me incomoda. Sei que está feliz agora, que tem outro relacionamento, veja, eu também tenho. Eu também sou um cara feliz, Elaine. Aposto que, talvez, mais feliz do que você realmente será, porque eu te conheço, quando você está feliz vai começar a se sentir no marasmo, e então as coisas vão começar a te entediar e a partir daí é um passo para procurar outra pessoa, outra situação...

Eu só me fico perguntando o que teria acontecido, quantos desenhos a gente teria feito e planos teriam nascido depois de uma noite de bebedeira. Talvez o seu segredo para esse seu relacionamento agora é que você seja infeliz. Algumas pessoas precisam disso para se dar bem. Então, talvez seja isso, talvez nós, se ficássemos juntos, teríamos levado uma vida infeliz, porque, aparentemente, só assim para você se sentir bem, não é, Elaine?

Então, você vai ficar feliz agora, Elaine?

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Em sonho, Caio


- Nora, eu tive o sonho mais louco ontem à noite.

- Que sonho, meu benhê?

- Sonhei com o Caio Fernanda Abreu.

- Como assim? Que coisa bizarra.

- Pois é.

- E o que vocês estavam fazendo, heim? Vai virar gay agora, é?

- Não, nada a ver, nada nesse sentido. Foi bizarro, eu não costumo lembrar de sonhos, aliás, nunca os levei muito a sério, mas...

- Peraí, deixa eu anotar isso aqui na agenda para contar para a Janete depois.

- Como assim, sua zuadora...

- Acho que lá vem bomba...quero guardar isso, às vezes sonhos tem significados né.

- Enfim, ele me dizia em forma de verso, quer dizer, ele falava normalmente, mas eu entendia em forma de verso...para de escrever isso...

- Me deixa, continua!

- Ele dizia algo como Manda dizer, por favor/ que os outros estão debochando de mim aqui/ para que tirar todas as minhas frases de contexto, isso só me traz dor/ mande parar de “compartilhar” elas assim por aí

- Ai, amor, acho que você está enlouquecendo. Ou ficando muito tempo no Facebook.

- Hahaha, eu também achei isso, eu também achei isso. Mas parecia tão real! Ele carequinha e tudo mais, como quando estava quase para morrer. Que coisa, né, que coisa.

- Que coisa mesmo. Mais alguma coisa?

- Não, ele só falava isso, depois não lembro de mais nada. Daí acordei, comi alguma coisa, tomei banho, vim falar contigo...

- Para tu ver...Desse jeito, a próxima a vir te assombrar é a Clarice Lispector, heim. E dessa sirigaita, tu toma cuidado, viu?


terça-feira, 20 de setembro de 2011

madrugada, madrugada...



- mamãe faz o melhor pudim do mundo
- ahhh
quero um pedaçoo
hehe
-um dia
se tudo der certo

sábado, 17 de setembro de 2011

O casal mais bonito de todos


- Vem, vamos, rapidinho...só uma vez...

- Eu não sei dançar.

- Para, é só se mexer, só balançar, me segue que eu te mostro.

- Não , não, não sei mesmo, desculpe, não quero..sou... todo descoordenado, você já devia saber disso.

- Eu te mostro como é. Segura aqui em mim...

- Você não desiste, né?

- ...Segura aqui em mim, isso, leve, devagar..agora a outra mão..assim mesmo. Viu, não é tão difícil.

- Não é tão difícil...? E essas pessoas todas olhando a gente, que droga...devo estar todo torto.

- Não tem ninguém nos olhando. E daí se tivesse? Se olharem devem ser inveja...Inveja do casal mais bonito de todos dançando no fim de uma festa.

- Hahaha...Casal mais bonito de todos. Só você mesmo. Você quase me faz acreditar nessas coisas.

- Cuidado com o pé...

- Desculpa, desculpa. Eles devem estar pensando é: “O que aquele desastrado faz com uma mulher tão bonita e elegante como ela?”

- É  o que você realmente acha? Haha...é que eles não sabem como você é bom de papo, né? Apesar de não dançar nadinha...

- O que eu posso fazer se meu coração não deixa os meus pés fazerem o que eles devem fazer?



segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Poema para você ficar


Assim que sair,
tentando não olhar.

Com segundas intenções

vou fingir também
que penso em não mais dançar
seguindo os seus passos.

Vai embora e não olha para trás,
que é só para alimentar mais

o rancor.

Eu ainda sei lhe inventar.

A gente – mesmo sem ninguém,
mesmo sem você
saber –;
ainda pode girar no meio do salão.

Para baixo e para cima.

Como dois que não querem encontrar a manhã.  


sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Um ano de Travessia


É, quem diria. Aqui estamos nós um ano depois. Aqui estamos nós em pé, fortes, ainda rendendo, ainda escrevendo. E não estamos menores, isto é, tivemos algumas quedas pelo caminho, mas outros entraram, outros ajudaram a manter o ritmo. Ritmo. Talvez seja isso que explique que uma ideia possa se manter, ficar, permanecer, sabe? Sabe. É o ritmo que se impõe que mantém tudo funcionando. E isso inclui publicações jornalísticas também. O que é uma revista, o que é um jornal, o que é um site se não um organismo vivo? Que produz, que reproduz, que analisa, que respira?

Respirar. É isso que o Nonada vem fazendo há quase um ano. Dia nove agora completaremos com orgulho 365 dias online sem interrupção. E isso não é pouco tempo para uma publicação que visa cobrir o jornalismo cultural com um viés mais aprofundado na internet e de forma independente. Não é pouco mesmo. Quem conhece essa área sabe que há um debate já antigo, mas sempre pertinente, sobre o rumo que o jornalismo que cobre a cultura tomou – principalmente nos jornais de grande circulação. Trata-se de um jornalismo pautado pela agenda, focado, em boa parte, no produto cultural e que não levanta a bunda da cadeira para tentar pensar um pouco mais além do release. Perdemos espaço de crítica, perdemos capacidade de selecionar pautas (já que a maioria delas vem diretamente das assessorias de imprensa para a confortável caixa de correio) e, por fim, perdemos a capacidade de nos revoltar.

Perdemos? Não, nem todo mundo perdeu, nem todo mundo se acostumou, nem todo mundo quer que as coisas continuem iguais. O Nonada veio sim para ser uma publicação que reflete, que seleciona, que busca se aprofundar nas pautas. E o site só chegou ao seu primeiro aniversário de forma independente porque as pessoas acessam e querem ter conteúdo desse tipo. Sim, e na internet – aquela plataforma em que insistem que se deve ser tratada superficialmente, porque se o texto for muito longo “ninguém” vai ler. Algumas das matérias mais acessadas do Nonada são as que tiveram a maior quantidade de caracteres. Se o conteúdo for bom, terá leitura, terá repercussão. Cada vez mais grandes revistas colocam seu conteúdo na internet. Para ilustrar, cito o exemplo da Piauí, que recentemente disponibilizou todo o seu acervo online.

Uma coisa que aprendi com o Nonada é que a gente tem que vencer na insistência. A princípio estava tudo contra nós: um site feito por estudantes (a grande maioria já se formou) cheio de outras obrigações, um site que não gera dinheiro, aborda a área cultural com uma proposta diferente do que a maioria do público está acostumado (logo, nenhum retorno imediato estaria garantido) e na internet ainda! Difícil, né? Difícil pra caramba. Mas estamos vencendo, e isso não é para todo mundo. Só conseguimos chegar até aqui porque fechamos com a ideia de travessia e porque tivemos um retorno positivo do nosso trabalho.

A parceria com a Revista Cult, uma das publicações de jornalismo cultural independente mais interessantes do País, a parceria com o jornal que cobre muito bem a área da literatura, o Jornal Rascunho, as editoras Arquipélago e Record mostram que o nosso trabalho está sendo reconhecido. Todas as citadas estão fornecendo prêmios para o nosso concurso de um ano do site, nesse link você pode acessar e saber como concorrer.

Queria agradecer, em especial, a todo mundo que ajuda a fazer o Nonada, todos que colaboraram em algum momento e, em específico, a aqueles que estão fechados com a ideia e com o site desde o início: Mariana Sirena, Leila Ghiorzi, Ariel Oliveira – que estão desde os primórdios, de pensar, planejar o site e também produzir. E quero também agradecer ao Daniel Sanes e a Mariana Gil que entraram logo que o site foi ao ar, e que realmente abraçaram o espírito de travessia.

Então, que venha mais um ano, mais caminhos e mais desafios. Estamos prontos.


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

ora bem baixo agora

Não me dê um dia de sol,

se virão outros três

de chuva.


Brinca com os dedos

e estala;

pois as palavras, depois, surgem,

como cometa.


Dá-me consciência

apenas se não querer

usá-la.


Os dedos calejantes

estão finalmente apontando as letras.


Tire tudo da minha pessoa que não seja pessoal,

deixe os medos, as lembranças, e a caricatura,


e tudo isso


que chega ao papel,

apesar dos dias,

da consicência.

domingo, 21 de agosto de 2011

Hey...

...quer saber? Você vai acordar amanhã às 8 horas e vai perceber que a vida vale a pena.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Sombra

Só de achar que havia te visto naquele auditório cheio hoje de tarde eu comecei a pensar imediatamente se eu estava com o cabelo arrumado, se a minha roupa não estava estranha, ou se eu havia engordado. Um pequeno aceleramento na batida do coração e uma sensação de fraqueza, como se estivesse com sono, mas também feliz ao mesmo tempo denunciavam tudo aquilo que eu tentava esconder.

Eu me vi caindo, caindo.

Mas daí não era você, apenas lembrava o seu sorriso que abre e fica estampado no ar por algum tempo, contagiando todos os átomos ao redor. Mas não chegava nem perto daquele modo de rir maluco, nem perto mesmo. Então tudo diminui, as batidas voltaram, tudo voltou, tudo ficou normal e chato de novo.

domingo, 31 de julho de 2011

Esconde esconde

Ao deslizar as mãos,
as pernas fecham,
mas você abre.

Ao encontrar o mel,
você foge
mas eu prendo.

E devagar a gente
combina os movimentos
todos ritmados:

Quem vai
Quem vem
Quem vai
Quem vem.

domingo, 24 de julho de 2011

Exceto você

Há um monstro em mim

e ninguém pode ver.


Ele já sabe que perdeu,

não tem mais chance de recuperação.


Entretanto, ainda

se esconde aqui,

excluindo-me momentaneamente.


Tomando forma

apenas ao lhe ver.


É quando desperta rancoroso,

aplicando os golpes mais

baixos possíveis.


Não é que ele consegue lhe deprimir toda vez?

segunda-feira, 18 de julho de 2011

em dinheiro

Bota no crediário

a gente vai pagar aos poucos


e aos poucos

roubar afeto do mundo.


Esquece o que eu te disse.


Só tenho cheques,

época difícil.


Olha assim, não.


É, afinal, mais garantido se pagar por amor

que perseguí-lo.


“Prefiria ter uma doença no fígado,

do que deixar

você me comer toda à noite

mas

mas

só aceito dinheiro

e você sabe disso”

terça-feira, 12 de julho de 2011

Caía água na conversa de Ramon e Anita

Meia noite e meia de segunda feira, quando, na cama mesmo, eles decidiram falar sobre o relacionamento. Estranhamente, foi ele que começara.

“Precisamos conversar, não sinto as coisas mais tão bem, quer dizer, não sinto mais as coisas tão assim...você sabe...”. Com as mãos enroladas no cobertor, ele tentara continuar a explicação, sem sucesso. As palavras surgiam em sua mente, mas desordenadas, incógnitas que ele precisava adivinhar. Era difícil e galopante, tal qual uma pessoa tentando montar em um cavalo arredio.

A chuva começara, e enquanto ele se desdobrava para tentar explicar o que estava querendo dizer, Anita só conseguia pensar se tinha esquecido alguma roupa no varal. O som da chuva espancando lentamente o telhado não lhe dava espaço para pensar em Ramon. Finalmente, após uns três minutos de repetições e de ideias circulares, ele soltou algo que a incomodou:

“Tenho medo que seja assim para sempre”.

Só escutando, sem esboçar nenhuma reação, Anita finalmente vira para o outro lado a ponto de encará-lo, mesmo que na escuridão do quarto. A chuva agora aumentara, se havia roupa no varal não importava mais, já estariam molhadas mesmo.

“Medo?” As telhas começavam a fazer um barulho estranho. “Não sei do que você possa ter medo”. A garoa que havia virado chuva agora virava tempestade. “Medo da rotina, medo de passar o resto da vida com a mesma mulher?”.

A tempestade logo venceu a casa, levantando parte das telhas que ficavam bem em cima da cama do casal, deixando água entrar. Mas eles nem deram bola. O jato de chuva caindo diretamente sobre os dois não impediu que Anita tirasse a aliança e jogasse no chão. “Anita, não exagera, não faz isso, não faz isso assim, não assim”, gritou .

Caminhando para fora do quarto, ela foi na rua tirar as roupas do varal, chorando baixo, com raiva dele e de si. Mas, lá no fundo, o mesmo pensamento martelava na cabeça:

“Será sempre a mesma coisa? Para sempre?”

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Fica, Fica

Diz que vai embora e

atravessa a sala toda torta.


Escorrega a mão

até a maçaneta

da porta.


Unhas, lábios, maquiagem a fazer.


Larga.

Espera, olha


para perceber.


“O que sobrou para nós?”


Nada para sustentar,

porta retratos com verdades

que ninguém vai comprar.


Hora é agora para não continuar

mas por que a cabeça

responde:


“Vai ficar, vai ficar”

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Carta 11

Caro, Zé

Um dia desses você me perguntou quando se sabe o momento que acaba o amor. Eu não soube o que responder na hora, esboçei alguma tentativa falha e acabei nos clichês, como “é quando você deixa de se importar com a pessoa”, ou coisas assim. Mas nós somos amigos há um tempo, e você já me conhece, sou daquele tipo que precisa pensar antes de falar, ou até necessito escrever, para organizar as ideias – ainda mais para uma pergunta tão difícil como essa. Então, nada melhor do que escrever essa carta.

A minha resposta a sua pergunta, entretanto, é: não sei. O que posso te falar é que amar alguém não é uma decisão, não é uma escolha sua. Você não pode fazer uma lista de pessoas com quem você pode se relacionar e simplesmente escolher uma. Bom, não é assim que funciona – mas isso você já sabe. Então, talvez a pergunta certa para você no momento seja: como é que foi que nasceu esse amor?

É sempre a partir do passado que se pode olhar para o futuro, não é? E é justamente a partir disso que a gente se dá conta dos momentos juntos, e se realmente vale a pena lutar por eles. Não confunda o amor com um jogo, ou que se tenha certas regras para cada pessoa. Não dá para inventar labirintos na sua cabeça, não dá para se levar pela imaginação quando se trata de pessoas. Quando falo lutar, falo de abrir espaços, de ceder, de procurar entender o outro.

E isso é difícil pra caramba.

Logo, não há um momento certo em que acaba o amor – ou que se sabe que acaba o amor. Há rastros, há pistas, há fatos, que levam a crer nisso. Há o tempo, há toda uma história que vocês montaram e que pode – ou não – acabar lentamente com vocês dois e só depende de vocês dois permitir isso ou não. Não sou nenhuma droga de especialista, mas, você sabe, pelo que eu já passei e acho que também posso falar um pouco a respeito. Não com tanta propriedade, porque, bem, quando se trata de amor ninguém pode falar com tanta propriedade assim.

Mas, você sabe, às vezes as pessoas combinam e às vezes não.

Um abraço,

Lucas F.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

À Natureza Danosa

Hera que tanto gostava de flores não estava ali no momento. Dormia encostada no sofá da sala. Serena. Enquanto isso Renoá balançava a cabeça, a pazinha, a enxada, na famosa posição de quatro, tentando de alguma forma fazer buraco no jardim, arrancar as ervas daninhas no gramado do casal que se mudara há pouco tempo para a cidadezinha. Infestavam o novo pátio, novo tudo, trabalho novo, nova vida que o pessoal da empresa havia prometido. Só esqueceram de falar da quantidade de plantas e de pragas que o esperavam. E Hera gostava de flores, tanto que convenceu seu marido a trazer várias mudas da antiga casa. E a plantá-las. Enquanto ela ficava só dormindo na sala.

Hera tinha também hábitos estranhos, como o de tomar banho de sol pelo menos três horas durante o dia. Apesar disso, permanecia branca como uma folha de papel em que não há nada escrito. Depois tiraria o seu cochilo, pois tomar sol a deixava, de certa forma, cansada. Já acostumado, Renoá não reclamava mais, até desfrutava pois, assim, podia tirar esse tempo livre sem a esposa para fazer as suas coisas, manter seu pequeno hobby de colecionar insetos, empacotando-os em pequenos saquinhos. Já tinha uma coleção. Seria uma herança, bolava plano para que os filhos pudessem estudar biologia, catalogando os insetos. Era assim que ele pensava.

Não era bem assim que ela pensava, mas tudo bem.

Renoá em sua epopéia no jardim conseguiu segurar com sua ardilosa mão uma grande raiz de uma maldita erva daninha. Estranhou de início, porque ela era realmente enorme, e pesada. Mas, mesmo assim, começou a puxar, puxar, puxar tão forte que sua mulher acordou e começou a ser arrastada por alguma força incrível na sala.

E quanto mais ele puxava, mais ela era arrastada. Mais ele puxava, puxava, até conseguir arrancar. Saiu do transe, ouvindo os gritos de desespero da mulher – e sem entender absolutamente nada – entrou correndo dentro a casa para ver o que estava acontecendo. Hera ainda estava atirada ao chão ofegante com os membros deslocados, a pele rasgada como se rasga uma folha, a pele também seca como uma folha que cai no outono sem vida. Já sem vida.

terça-feira, 31 de maio de 2011

We used to wait


“So I never wrote a letter

I never took my true heart

I never wrote it down

So when the lights cut out

I was left standing in the

Wilderness downtown”


quarta-feira, 25 de maio de 2011

Crônicas de um repórter novato – parte XXI


Ando com muita opinião entalada na garganta. É por ali que elas ficam, quando não tenho a oportunidade de me expressar. Ando sem tempo também para escrever textos mais longos, porém, hoje, aqui no trabalho estou deixando os afazeres momentanemanete de lado e tentando esboçar algumas ideias sobre jornalismo. Na verdade, são fatos simples que deveriam ser seguidos por todos nós. O problema é que a “regra” parece ter virado exceção: são mais numerosos os exemplos do como não fazer, do que os de como fazer. Pretendo dividir esse post em tópicos, cada um evidenciando valores que, a meu ver, deveriam nortear o caminho do jornalista.

Colocar-se no lugar do outro

É difícil para qualquer pessoa se desvencilhar de preconceitos, de tratar e observar sem apontar algum julgamento. Como jornalista, entretanto, é necessário colocar-se no lugar do outro, e isso só se consegue se você estiver no mesmo “pé” que ele. Estar atento com o que acontece com o sujeito, seu contexto, seus problemas, seu modo de falar, de agir e de viver. Colocar-se no mesmo patamar é não observar o entrevistado, por exemplo, como alguém que você está ajudando, como se fosse um Deus que “ilumina” um desconhecido. Não. É você deixar seu preconceito de lado e tentar entender a sua história, simplesmente. É papel nosso também não reproduzir os preconceitos que vemos em certos veículos de comunicação.

O olhar humanizado

Não é uma questão de preferência política, ou de a linha editorial de veículo tal ser de “esquerda” ou de “direita” (definições que já não cabem mais, essa já é outra discussão). Trata-se de procurar sempre o lado humano, social da pauta e ver como tal assunto influenciará no cotidiano daquela sociedade em que está inserido. Não é ser conservador, liberal, socialista, anarquista, jornalismo é a profissão onde se trata e se repercute o que acontece com o sujeito em dado momento. Não se trata de escolher lados também, contanto que esteja do lado do cidadão – e isso não deveria ser algo de “esquerda” ou de “direita”. Em um país recente como o Brasil, com uma imprensa que sofreu censura durante um longo tempo, é natural que se observa uma polarização da mídia em que os grandes veículos de comunicação estariam ao lado da censura e da direita e que poucos teriam um viés da esquerda. Para mim, a questão é muito mais profunda que essa, envolve, antes de tudo, a função do jornalismo na sociedade: desenvolver a cidadania, respeitar a ética e prestar um serviço de qualidade a sociedade.

Compromisso com a verdade

É clichê dizer isso, mas os clichês são verdadeiros. O jornalista deve ter um compromisso com a verdade, deve sair com ela, levar para o cinema, pagar o jantar e dormirem juntos. Para o resto da vida. É um casamento. Jornalista mentiroso é jornalista ruim. Não tem outro jeito, sabe. Como se trabalha com fatos, e sabe-se que fatos são verdades, é preciso ir atrás delas de qualquer jeito. É por isso que a apuração é das ferramentas mais importantes para o bom jornalista. E o que é a apuração se não a busca pela verdade? Pegar uma informação não completa, ou errada, e poli-la aos poucos, descobrindo outras facetas, limpando, reduzindo, até chegar na informação diamante bruto, pura. A verdade, nada mais que a verdade.

“A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."

A frase é do escritor e jornalista Graciliano Ramos e é válida para ambos profissionais. Algumas pessoas deveriam tatuar isso no braço, ou melhor, na testa para perceber que “enrolação” não combina com o texto jornalístico, que deve ser, sobretudo, sucinto, objetivo, ainda que a objetividade seja um conceito nunca alcançado. É a linha do horizonte, espécie de miragem, sempre desejada, mas nunca totalmente alcançada. O problema é a implicação que o termo Jornalismo Literário carrega. Tudo bem pegar técnicas narrativas emprestadas da Literatura, mas o jornalismo literário é, na verdade, uma grande reportagem muito mais aprofundada e com um grande trabalho de apuração para que se possa utilizar com crédito a descrição. Para que se possa deduzir através de vários relatos, fatos, como aquela cena aconteceu. Trata-se também de relatar as suas experiências com qualidade, e fiel objetividade. Não há problema de se trabalhar com o “eu” em uma reportagem, contanto que não haja exagero de egocentrismo. Usar o “eu” para falar do outro, ou de algo mais amplo, é o caminho.

Não olhe apenas para o próprio umbigo

O bom jornalismo só se faz em conjunto. Quando se trabalha em equipe, compartilhar suas ideias para um empreendimento, para um novo jornal, é essencial para que as coisas comecem a dar certo. Não dá para ficar olhando apenas para o seu próprio umbigo, se vangloriando da sua ideia. Uma publicação, antes de tudo, é um organismo vivo em que as partes só funcionam como um todo, quando todas compartilham do mesmo ideal. E em uma época em que o as redes sociais estão tão difundidas nada mais natural do que aproveitar essa onda.


Agora me vem essas a cabeça, que me parecem essenciais. Convido os interessados a continuarem essa lista e a discussão nos comentários.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Nem volto

O que a boca fala

nem conta tanto.

O que dói é a marca

no pescoço.


Ignora e não repete, por favor.


Dúvida nem poema

sabe muito bem

compor.


Eu é que sei.

Eu é que vou dizer.


Vai olhar com a cara de espantada

- fingir tudo, como sempre faz –

e esperar.


Pra vê se melhora.

Mas

nem volto atrás

mais.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Quase

Devagar, atirou as roupas ao chão.

Depois com o pé nu,

com tudo nu


virou para mim e riu.

Como uma criança

que se esconde,


esnobe, foi até a cozinha.


Só em pêlo, comentou estar com sede e

que precisava de uma droga de bebida.


Sempre risonha correu ao banheiro

enrolando-se na toalha de secar.


Ligou e desligou o chuveiro.

E virou o copo duma vez só.


Voltou para o quarto, fugindo da cama.


Fugindo de mim, catou todas as roupas rapidamente

e rapidamente entrou nelas.


Rapidamente também fechou a porta e foi embora.

sábado, 7 de maio de 2011

Um dengo

Ela fica toda dengosa quando tá bêbada. Vem correndo para mim, mesmo usando aquele salto alto, e me abraça como se eu fosse desaparecer no instante seguinte. E diz coisas assim, “você é o cara mais legal que eu já conheci, se eu acabar contigo, não deixa isso acontecer, vai atrás de mim e me mostra que eu to errada”, entre sorrisos acolhedores e medrosos. Me faz carinho com a mão, com a parte de trás da mão, circulando o rosto, olhando, me observando, tentando pensar no que falar. A maquiagem perfeita, nada nada nada borrada. O sorriso malicioso me levando a ficar malicioso também. Ela usa uma saia preta que esconde as coxas, deixando só um pouco de fora. Há também a blusinha com alça e o copo de bebida na mão. Os seios empinados, é pequena e toda bonita, escapando com sorrisos por aí. A bebida deixando os nossos corpos mais carentes. Carente por nós. Um dengo só - e para mim.

terça-feira, 3 de maio de 2011

guardados

Dá não para negar

que eu e tu

assim, igual a dois + dois,

somos só quatro.


Vou dizer que sim,

afirmando em união

que vamos passar a utilizar

o nós.


E agora não só de vez em quando.


Agora não só para respostas casuais.


Eu, tu declarados em etapas.

Escreve, repete, assina.


Tu, eu completados por aspas.

Em sobrenomes agregados.


Em anéis.

sábado, 30 de abril de 2011

Arquivados

Eles tomam café adoidadamente

reclamando que o dinheiro

está curto.


Eles mexem nas suas

grandes, modernas e caras

máquinas de xerox.


Eles esperam outros eles

saírem da cena para fofocar,


para começar a falar mal

de tudo que eles não tem.


Eles fazem cópias cópias

cópias cópias cópias cópias

para deixarem em um arquivo


para sempre.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Como ser um bom mentiroso

Senta lá, Onofre. Senta lá e pega o seu caderno de anotações. Agora você vai entender como ser um bom mentiroso. Na realidade, meu jovem, é muito simples. Há aquela máxima que para ser um bom mentiroso você precisa acreditar na mentira que está contando. Então apenas ter fé na sua mentira é o suficiente? Não, apenas isso não basta. Também é preciso transmitir a mentira de um modo convincente. E, ao fazê-lo, não seja exagerado, não atue, ok? Você não é a porra de um ator. Apenas tente ser o mais natural possível, faça uma expressão mediana (leia-se de confuso, aborrecido) com o seu rosto, e nunca, mas nunca, abaixe os olhos. Seja firme como a mentira que você está contando.

Com certeza dará certo, Onofre. Veja aonde eu cheguei. Não pode duvidar do poder da mentira. Ou melhor, o poder de uma ideia. Uma mentira também é uma ideia, uma ideia que não pôde acontecer. E por ser algo que não aconteceu, uma mentira não pode ter uma grande história e envolver muitas pessoas. Não. Pense em uma mentira como uma pequena cena. Uma sketch. Pode se contar várias mentiras diferentes, mas nunca uma grande mentira. Essa é regra de ouro. Ok?

Olhe para mim, eu não estaria tão bem assim se não soubesse o que estou dizendo. Está anotando tudo? Anote tudo aí. Ah sim, contato físico: para mim sempre foi o mais difícil, como disse antes, nunca abaixe os olhos, nunca desvie o olhar. Na hora de apertar a mão seja confiante, mas não demonstre demais. Se suar, sorria. Ah sim, sempre sorria. Um sorriso confiante sempre abre as portas, as boas portas da mentira.

O problema da mentira é que ela é viciante. Tome muito cuidado nisso, ok? Muito mesmo. É uma droga para usar nos outros e não em si próprio. É muito importante que os outros acreditem em você, mas você não deve acreditar nas suas mentiras. O bom mentiroso segue esses pequenos códigos, ok? Uma mentira realmente boa, bem planejada, concisa e reta você pode ter certeza que ninguém vai querer estragar com uma verdade qualquer.

Não tenho muito tempo se não poderia te ajudar mais. Ok, Onofre?

sábado, 23 de abril de 2011

Gente vai

Amanhã


Em torno das duas horas.


Vou subir as escadas e chegar até a sua casa.


Abrir a porta, fechar a porta.



Tirar toda a sua roupa de dona de casa.


Depois te esticar levemente na cama.


Com as pernas assim, assim para mim.



Amanhã.


Em torno das duas horas.


A gente vai, a gente vai.


Como se nunca tivesse ido antes.



Amanhã


Amanhã, a gente vai.

domingo, 17 de abril de 2011

A tão falada "bagagem cultural"


Não é novidade para ninguém que aumentou o número de brasileiros viajando para o exterior nos últimos anos. Meu objetivo aqui não é dar dados específicos sobre a quantidade de pessoas que viajam e etc, mas o fato é que a economia melhorou e assim a classe média consegue um financiamento maior para dar aos seus filhos aquela tão sonhada viagem. Pode ser um intercâmbio, uma trip em família, ou apenas alguns dias de diversão na Europa.

É claro que não é um fenômeno novo. É natural do ser humano querer viajar, conhecer novos lugares, novas pessoas, manter novas relações para assim conseguir uma “bagagem cultural”. Alguns também pensam no currículo e acreditam que uma estadia em outro País vai ajudar naquela busca pela língua estrangeira, tão necessária para aquele emprego.

Tudo bem.

E é importante também estudar em qualquer outra Universidade do mundo, porque o ensino aqui é pior, e, vocês sabem, brasileiro não tem educação. Ou porque lá sim é que as pessoas têm cultura. É verdade, já cansei de ouvir esses comentários de brasileiros que pretendem viajar, ou já voltaram de viagem. Como se cultura fosse algo adquirível, ou como se pudéssemos comparar duas culturas. Como se o ensino lá fora sempre fosse melhor.

É essa conduta de eternos seres colonizados que nos fazem falar essas besteiras sem cabimento. Não valorizamos os nossos trabalhos, as nossas descobertas, porque é sempre mais fácil culpar o que seria a “corrupção enraizada na nossa sociedade”. É claro, todo político é corrupto, toda pessoa que mora em favela é ladrão. Adoramos generalizar nosso povo, e esquecemos de como se forma o conceito de nação. E é sempre mais fácil reclamar do que tomar uma atitude. Acabamos enlaçados em uma espécie de preguiça programada. Se é muito difícil, não vamos fazer. Peraí tem algo errado. Não são os outros que são melhores que nós, somos nós que não fazemos nada a respeito.

Ao invés de valorizar a nossa história e a nossa vasta e heterogênea cultura queremos viajar para a Europa a fim de tirar as mesmas fotos em frente à Torrei Eiffel. Desejamos tomar um café em Paris, precisamos ir para a Oktoberfest na Alemanha, assistir a uma tourada em Madrid. Porque, você sabe, a vida não valeria a pena sem essas coisas.

Meu Deus do Céu.

Esquecemos de uma palavra muito importante nessa ideia de “bagagem cultural” que adquiríamos em uma trip pela Europa: envolvimento. Há um texto muito interessante do pesquisador Ulpiano de Meneses que versa exatamente sobre essa ideia de turismo cultural, tão em voga, principalmente pelas Agências de Viagem. Em uma sociedade que trata a cultura como um “segmento”, ao invés de tratá-la como uma qualificação capaz de iluminar todo e qualquer segmento, a lógica da separação também acaba determinando a existência de usos e funções culturais específicos. É aí que entra a diferenciação entre uso cultural do bem cultural.

De um modo simples bem cultural é o que é vendido para a pessoa em um pacote de viagem, por exemplo. Há aquela metáfora clássica do grupo de turistas que em visita a uma Catedral Gótica encontram uma velhinha ajoelhada diante do altar-mor, profundamente imersa em oração. O guia então bate em seu ombro e lhe diz – “Minha senhora, vocês está perturbando a visitação”. Essa metáfora é autoexplicativa: a afirmação do guia vem ao encontro da explicação de bem cultural, onde não há espaço para uma prática da existência corrente, como a oração. A anciã está de fato perturbando o agora padrão dominante em que o edifício se tornou. Um exemplar arquitetônico de “interesse cultural”. O envolvimento dos turistas com a Catedral é quase nulo, nada mais do que um interesse fugaz que pode ser registrado em uma foto. Não me diga que você vai conseguir estabelecer uma vida cultural ficando alguns dias em uma cidade. Só terá condição de aprofundar-se quando atingir o o quadro da habitualidade, o que, necessariamente, demanda tempo. É o caso da velhinha que possui uma fruição profunda, vivenciada na qual sua oração envolve não só uma apropriação afetiva mas, sem dúvida, também estética.

O que quero dizer com isso é que há muitos brasileiros preconceituosos com sua própria história, e que preferem visitar outros países esporadicamente apenas para possuir aquela foto que todo mundo tem em seu álbuns de Facebook. Ao invés de se aprofundar no seu País, ao invés de parar de generalizar e manter a sua percepção de povo colonizado. Tudo isso me parece um pouco hipócrita, covarde e ignorante – no sentido básico da palavra.

sábado, 16 de abril de 2011

Carta 10

Lídia cresce rapidamente, já está alguns centímetros mais alta desde a última carta. É verdade, e mais loira também. Obviamente puxou isso da sua família. De mim, com certeza o nariz. Eu tenho belo nariz, você mesmo dizia. Tivemos que comprar roupas novas na semana passada, já que as aulas dela vão começar daqui alguns dias.

Queria que você visse o rosto dela, Arthur. Ela realmente está empolgada, quase não dorme direito. Fala da escola, e de futuros amigos, amigos, amigos. Esse é o problema de crescer sozinha. Acho que, no final das contas, só uma mãe não pode dar conta de tudo, né?

Não falo isso para que você se sinta culpado. Longe disso. Falo isso porque eu preciso falar para alguém. Mesmo que você não vá responder. Falo isso também porque tenho medo, tenho muito medo que as altas expectativas dela não sejam cumpridas.

E se ela não arranjar amigos na escola? E se não gostarem dela por algum motivo banal e excluírem-na?

Você sabe, crianças podem ser tão cruéis. Eu era assim, até. Solitária pra caramba, Arthur, mas a Lídia não, a Lídia quer ter tantos amigos. Não sei como agir o suficiente e sei que você saberia exatamente o que me dizer nessas situações. Tudo iria ficar bem de alguma forma.

Agora já não tenho certeza. Agora que você está longe não dá para ter certeza de nada.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Junk


"Motor Cars, Handle Bars
Bicycles for Two
Broken Hearted Jubilee

Parachutes, Soldier Boots
Sleeping Bags for Two
Sentimental Jamboree

Buy Buy
Says the Sign in the Shop Window
Why Why
Says the Junk in the Yard

Candlesticks, Building Bricks
Something Old and New
Memories for You and Me

Buy Buy
Says the Sign in the Shop Window
Why Why
Says the Junk in the Yard"

"

segunda-feira, 11 de abril de 2011

- Sabia que você era muito mais interessante solteira?

- Ahn, como assim?

- Sei lá, antes só de te ver dançar na minha frente, eu já passava mal. Parecia louca, mas sabia que não era louca. Era doce e livre. Acho que sinto falta de te ver livre.

- Você não gosta é de me ver com o Tomaz, né.

- Nada a ver. Um cara não pode gostar de apenas assistir a uma mulher dançando?

- Não quando se trata de nós dois...não quando...você sabe, não vou ter essa conversa novamente.

- Não estamos tendo aquela conversa, eu só fiz um comentário. Um simples comentário. Você sempre foi mais interessante solteira. E você sabe disso.

- Não dá para uma garota ser solteira para sempre.

- Eu quase chego a me arrepender...

- Se arrepender?

- É, eu tive a chance, mas eu...eu nunca quis te ver presa. E eu sempre imagino aqueles momentos sem compromisso que nós tivemos, esses momentos que ficaram soltos em algum lugar entre nós. Que não evoluíram somente porque um de nós não quis. Eu. Eu não queria te ver presa, eu não queria te tornar desinteressante. Por isso acho que o que tive com você nunca será igual a qualquer outro relacionamento que eu possa vir a ter.

- .....

- Entenda, não é que eu não goste do seu namorado intelectual...

- ....

- Aposto que ele deve ser o máximo te mostrando todos aqueles filmes antigos.

- ....

- Todas as músicas hypes.

- ....

- Enfim, eu só queria dizer isso.

- ...Ah, Renato...

- .....

- Ah, Renato, algum dia nós vamos tomar jeito?

sexta-feira, 8 de abril de 2011

A quem nada atenua

Gosta de me ver como

se não percebesse.



E interpretar dos meus calos,

os seus descasos.


Jogar na cara:


Sempre, nunca de vez em quando,


tudo que eu mereço.


- E eu mereço?


Depois dorme e acorda;

sem nenhuma problema;

sem nenhum arrependimento.


Enquanto a maioria da gente não consegue pregar o olho à noite.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Só o triste

Logo após agarrá-la pela cintura,

sentir a respiração brutamente no

pescoço, seio, barriga.


Os dedos escorregando suavamente

entre os fios de cabelos que

também escorregavam suavemente

para as costas.


Depois de rolar esboçadamente

pelo carpete no meio de copos,

no meio de pratos.


(que ela havia anteposto, antes, juntamente também

antes com o filme de boxe que assistimos em PB)


Mesmo após o corpo

sobrepor o outro.

Mesmo após completar-nos

sem sentimento.

Ela só sentia o triste.


Era tão visível que só sentia o triste.


Aquele dia durante o banho é certo que ela chorou,

mesmo afirmando que não.

sábado, 26 de março de 2011

Caiu com os olhos agora menos loucos

Elisa não gostava de arrumar a casa e era tudo uma tremenda bagunça. Os lençóis atirados em um canto da sala esperando dias para serem lavados, sacos de lixo empilhados e as gaiolas dos pássaros levando semanas para serem trocadas. Eu chegava no fim de tarde, começo da noite, e ela nem para me perguntar sobre a rotina. Quando ligava para o trabalho quase sempre era para me dar ordens do que trazer quando chegasse em casa. Cigarros, cerveja, e “qualquer coisa”, como ela dizia, para comer.

Mesmo assim tentava convencê-la a procurar emprego para a gente tocar a vida e também dizia para começar a freqüentar as reuniões de AA, apesar de eu também acabar bebendo boa parte da noite para aturar, para nos aturarmos durante aquele tempo. Eu lhe digo, eram coisas loucas, sabe. Tínhamos pintado a casa logo depois que nos casamos, isso um ano antes desses acontecimentos, mas a parede agora estava toda engordurada e carregava até uns desenhos bizarros de pessoas voando em campos verdes observadas por um sol com aquele sorriso feliz que Elisa desenhava quando estava muito bêbada.

Isso acontecia sempre na sexta-feira à noite e se estendia até domingo. Era quase um costume: ligar o som no volume mais alto, tomar tudo que tivesse na geladeira, vodka, batida de rum, cervejas. Amar é uma palavra complicada, mas acho que sim, acho que eu realmente amava Elisa. A gente ama e tenta nos convencer, hoje penso que eu bebia tanto porque eu queria estar com ela, me sentir como ela. A gente ama e tenta nos convencer sempre. Costumávamos fazer muito sexo nessa época, coisas que os vizinhos comentavam baixo depois, ao me ver saindo do trabalho na segunda-feira completamente quebrado com a gravata, o paletó e o cabelo com gel. “Eles parecem animais”.

E foi em um domingo à noite, com a música alta e uma garrafa de tequila atirada no sofá rabiscando na parede que Elisa começou a chorar, a chorar desesperadamente, molhando boa parte dos seus cabelos pretos. Estava só de calcinha e de sutiã, fazia muito calor e os mosquitos nos picavam. “Eu não aguento mais, eu quero ir embora. Você me prendeu, eu nunca quis casar com você. Eu não quero ter uma casa”, ela gritava jogando a caneta para cima de mim. E vindo ao meu encontro, ela tentava me golpear, com os dois punhos totalmente cerrados, a cara de louca. Eu nunca a havia visto daquele jeito. Comecei a gritar e a dizer que ela estava bêbada e que a gente não poderia continuar vivendo assim. “Elisa, não dá mais, não dá mais. Para, para!”. Mas ela não poderia, não conseguia.

Foi então que bruscamente pegou a garrafa já vazia de tequila e tentou me golpear fortemente, um ataque frontal, direto. Por sorte, eu estava menos bêbado, e mesmo tonto consegui desviar. Agora ela era que estava resvalando, fora de si, pedindo ajuda. Dei um soco de punho fechado no estômago. Não foi bonito de se ver, não era algo bonito para se fazer, mas fiz. Ela vomitou sujando toda a parede com os desenhos malucos. Depois me olhou, e caiu no colchão instalado no chão. Parecia com sono e menos louca agora, quem sabem realmente menos louca agora.

terça-feira, 22 de março de 2011

Diálogo só

Qual o problema de conversar comigo.

Comigo o problema é conversar sobre o quê.

Quais coisas. Quais coisas que você quer fazer.

Agora, pode ser agora? Eu realmente gostaria que fosse agora.


Vai dizer que não dá mais. Não, vai inventar que não quer mais.

Nem para fingir, fingir que ainda tem fé em se importar.


Ou mentir, mentir para alegrar.

É bom, é bom de pensar que ainda poderia dar.


A gente vai se deitar nos trilhos e dormir um pouco.

Tal qual um trem antes de descarrilar.

Só pelos velhos tempos, só para ter o que fazer antes de ir embora.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Como se estivesse alçando vôo

Lá estava Elaine ao lado de Eriberto, deitados na cama, cama arrumada com os lençóis completamente limpos. A luz fraquinha, de lâmpada de 20 watts pendia no abajur na cômoda perto do guarda roupa. Parecia um mini pôr do sol alaranjado, que também se deitava no escuro, escorregando a pouca energia elétrica.

Mesmo deitada há tanto tempo seus olhos insistiam em se manter abertos, encarando a noite, pregando peça de que estavam fechados. Ao contrário de Eriberto que dormia ao seu lado, como uma criança. Nenhuma parte do corpo magro de Elaine tocava em seu companheiro. Seus grandes braços estavam juntos embaixo do travesseiro como se escondesse algo nas mãos. Ali, deitada de lado, quase que encolhida, conseguia ver a porta, graças a luzinha. Deus, como ela gostaria de dormir. Deus, como ela gostaria de sair da cama, caminhar até a cozinha e pegar um copo de água. E ela nem estava com tanta sede assim. Ela também gostaria de depois de pegar o copo, abrir a outra porta, a da rua. E caminhar livre. Solta. Encontrar a janela no corredor do prédio e abrir.

Assim, com todas as portas escancaradas e com os olhos abertos durante a escuridão do quarto, ela conseguiria manter a calma. Já poderia sentir o vento da janela, o pequeno pulo para o inconsciente. As nuvens misturadas com a sede, a luz laranja queimando seus pensamentos, tudo apagando. Tudo desmoronando, a sensação de cair e depois pairar, justamente como se estivesse alçando vôo.