quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Teoria número treze: sobre a manipulação e as criatividades

A vida é uma total manipulação. Em todos os momentos estamos usando alguém, ou estamos sendo usados por alguém. Um mundo de interesses. Não foi assim que fomos acostumados? “Eu só faço, se tu fizer também”, ou “se o fulaninho fizer, também me atiro da ponte”. É claro que estou exagerando, mas a vida pode ser fortemente observada dessa ótica. Você lê um texto e muito dele fica com você, e quando vamos escrever, lá está ele, influenciando-lhe ao máximo. Manipulando as suas vontades, de certa forma. O que é um ser humano sem as coisas que lê, vê e entende? Aprendemos por manipulação, por imitação. Somos seres copiadores.
Mas não é só isso (ainda bem), imitamos, mas também mudamos, ou melhor, transformamos, usando a capacidade criativa de cada indivíduo. Tornando algo diferente. E é nesse ponto que surge a graça no mundo, logo, não seja totalmente manipulado por alguém, não copie. Mude: abuse da sua criatividade, ela é SÓ sua mesmo.

Crônicas de um repórter novato - parte I

Não sei porque tinha me vestido com a camiseta do grêmio do meu pai da década de setenta no dia da entrevista. Talvez porque com ela, André Catimba, número nove, matador, nordestino, baiano, tenha feito o gol que acabou com a hegemonia dos colorados no Rio Grande do Sul na década de setenta. Ou talvez porque eu apenas me sentia bem com ela. Naquela tarde estava me encaminhando para a entrevista mais importante da matéria que estava escrevendo sobre o Bailei na Curva. Com o diretor da peça, Júlio Conte.


Demorei a conseguir seu telefone, e demorei mais para marcar a entrevista, pois ele parecia sempre ocupado, atendendo os seus pacientes (ele também é psiquiatra), ou trabalhando com o teatro. Acabei insistindo, e ele me cedeu um espaço. De tarde, numa quinta feira.


Cheguei cedo ao prédio, onde ele atendia e morava. Cedo demais. Ainda faltava meia hora ou quarenta minutos para a conversa. Acabei trafegando em frente ao prédio, jogando conversa fora com o guarda que ali aparecia a todo o momento. E cuidando sempre as horas. Imaginando se as minhas perguntas estavam boas, queria despertar algum sentimento diferente nele, mesmo que a pauta fosse algo meio burocrático sobre os 25 anos de uma peça. Acontece que era uma peça bem importante. Um “divisor de águas” como ele falaria mais tarde. Fiz umas 12 perguntas, pesquisando, olhando entrevistas mais antigas, analisando, mas não estava muito confiante. Talvez porque fosse a minha primeira vez, quer dizer, não a primeira entrevista, mas a primeira vez que me locomovia até o lugar, a primeira vez que havia insistido com alguém para que ele falasse, e a primeira vez que tinha pesquisado e realmente me “encarnado” nas perguntas. Talvez por isso meu estômago doesse a cada degrau que eu subia para adentrar o prédio, e a náusea só aumentou, quando descobri que o andar era o décimo oitavo. Elevador é claro. Com as mãos meio frias desci dele e entrei na anti-sala, onde alguns quadros pendiam na parede sob a luz amarela. Bati uma vez, e nada. “Deve estar atendendo”, pensei eu, e sentei logo numa cadeira de madeira vernizada, preparada para o tempo de espera. Cinco minutos se passaram, mas foram longos. Revisei as perguntas, risquei algumas coisas, elaborei melhor, ou pior e logo, a porta se mexeu. Uma paciente saíra, e ele me chamara, com um semblante sério, de barba um pouco branca, era um homem por volta dos cinqüenta anos, com elevada cultura, formado em medicina e teatro.


Caminhei em sua direção e apertamos as mãos, lembrou-me do tempo que tínhamos, “meia hora, não?”...e caminhamos para a sala. Uma mesa transparente de vidro, ele sentou a minha frente. Eu com o gravador analógico e o estômago ruim. Sortido. Fiz as primeiras perguntas, esperadas, até porque eu tinha que fazer, para tirar citações que desejava dele. Acabei recolhendo uma história interessante, onde ele dizia de onde veio o investimento para a primeira apresentação da peça. O resto da entrevista fluiu direito, e muito mais normal do que imaginava 18 andares abaixo. Naquele momento enquanto ele falava dos atores, das apresentações, de como historicamente um ator representa toda a comunidade. Ali eu entendi que todas as entrevistas que fizemos, deixam alguma coisa conosco, mesmo que infimamente, mesmo que seja apenas uma fagulha no nosso cérebro. Muitas pessoas desmoralizam os jornalistas, porque eles simplesmente abordam uma matéria por algum tempo, mas logo a deixam e partem para uma mais interessante, ou que o público ache mais interessante. Acontece que não é necessariamente assim, há aqueles que se especializam em algum setor. Afinal de contas, o jornalista não pode saber de tudo, ele é apenas um canal, por onde a informação escoa, apuramos, mas não deduzimos necessariamente, analisamos pela ótica da sociedade, ou do veículo. Somos canais de informações.


Saí da entrevista revigorado. Júlio Conte levou-me até porta, apertou a minha mão, e deu tchau. Enquanto eu só pensava como iria estruturar a matéria no jornal, quantas caracteres eram mesmo? 6,000 e pouco e se eu dividisse em três partes, cada uma contando uma história.....(...)

domingo, 25 de janeiro de 2009

Funestas e bebidas à vontade

O cadáver me admira, sinto-me meio enjoado com a sensação repugnante que – muito infelizmente – me passa. Olhar triste de um pesar morto sem querer, ela está parada no canto, observando tudo, rondando-me. Há quantos dias está ali? Acho que perdi a maldita conta. O que sei é que me consome por completo, suga-me, nutre-me, desfalece-me e quebra meu ser em inúmeros pedaços, sendo que cada vez que tento me reconstruir é como se eu me montasse cada vez mais impropriamente. Uma peça mal encaixada no cérebro, talvez sinopses falhas excluindo os meus – poucos – pensamentos sãos. Quando me transpareço no espelho, reparo me diferente. Da última vez meus olhos estavam com uma coloração cinzenta marrom, parecendo expressar dores que eu nunca senti. Às vezes, minha pele muda de cor e as minhas mãos fazem movimentos solitários e tão desprezíveis que chego a me bater, só para elas pararem de serem tão malcriadas. Ultimamente tenho me desobedecido muito, não faço mais nada, não leio, não escrevo, mas não parei de beber e de vomitar. É culpa dela que sempre me acompanha me machuca e me ilude. Esse maldito fantasma. Pára, pára de me olhar. Eu não existo, eu não vou mais acontecer, quem sabe assim você me abandona? Ou, quem sabe, sou eu que preciso lhe abandonar e deixar você ir de vez?

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Me conta um segredo

Anna olhou para Ricardo com um olhar de aflição. Há horas ele não falava nada. Nem uma palavra, nem um simples “sim” ou um simples “não”. Apenas caminhava pela casa, em um passo sério e honesto, ora na cozinha, ora na sala, ora olhando pela janela no corredor da casa. Ela nem sabia o que dizer. Será que ele havia descoberto o seu caso com o vizinho ao lado. Será que Ricardo suspeitava das noites em que ela saia com o seu João. Logo o Seu João! Ricardo e eles eram tão amigos. Mas ela não podia evitar. Foi algo nas mãos dele, as quais conduziam com tanta veemência aquele carro vermelho bonito. Mas e o Ricardo? A quietude dele já incomodava, um silêncio que fala pelos cotovelos. “Talvez ele tenha feito um plano todo e o Joãozinho já esteja morto, esfaqueado no apartamento ao lado, e eu seja a sua próxima vítima, eu sabia que era perigoso, droga”, pensava ela, suspirando pelos poros, imaginando o sangue vermelho berrante pulando nas paredes. Devagar, ela resolveu ir ao encontro do marido. Falar que iria sair para comprar verdura – na verdade um plano obscuro de visitar o Seu João. Chegou perto, lentamente, respirando, controlando tudo. Depois que proferiu o aviso, não deu tempo para mais nada, Ricardo segurou forte em seu ombro, puxou ela para perto e deu um abraço quieto, sussurrando, “Anninha, anninha, fui buscar os seus exames hoje, um teste de sangue, nele diz que você está grávida, eu nunca te disse mas, mas...eu não posso ser pai”. Anna ficou branca que nem uma vela e depois teve seu primeiro enjôo de gravidez, sujando todo o assoalho.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Nós nunca vamos desistir (Vamos despencar de pé)

A música sempre falou por nós.
E naquele momento,
lá no carro,
ela não parava de gritar.
Não me lembro da letra
só da melodia, que aumentava
conforme as curvas
da
estrada.
Chegava a ser engraçado.
A sua cara de espanto
Enquanto
Eu balançava a cabeça para fora:
“Diga não, agora”.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Dr. Gelson

Eu tinha cerca de seis anos, ou menos talvez, quando conheci o meu pediatra. Vivia doente da garganta e das inúmeras alergias, mas ele sempre me acalmava, de alguma forma bolava um jeito de derrubar as minhas enormes defesas. Era o futebol com a bola colorida de brinquedo, ou as conversas sobre o colégio e o futuro. Ainda me lembro de sua figura, alto, narigudo, careca, paciente, alegre. Uma leveza sábia em todas as suas atitudes, e a sensação de confiança no que fazia. Alguém que realmente ama o seu trabalho. Ele foi o meu exemplo, talvez subconscientemente, de bom profissional, uma trajetória que eu gostaria de seguir. Não sei se tenho futuro no que faço atualmente, mas sempre que me vejo em dificuldades me pergunto o que o Dr. Gelson faria, como ele agiria. E claro, quando tenho uma das minhas crises de garganta, ou de alergia, dá vontade de voltar ao consultório dele, mas não sou mais uma criança - infelizmente.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Epifanias - Fungo nos olhos

Cap. II

E eu só me arrependo de não ter comprado antes. A droga da escuridão, por que a velhice traz dessas coisas? No meu caso não foi bem o tempo o vilão, mas sim a doença que invadiu o corpo fraco. O fungo no olho, explorando o cansaço veio para comprovar o que eu já sentia há tempo: atestado médico de cegueira. E tudo que eu conseguia pensar, enquanto o médico falava sobre possíveis tratamentos é que nunca mais poderia dirigir novamente. Meu carro vermelho tão vibrante, tão, assim, novo. Nem acabei de pagar as prestações e já perdi a chance de sentir aqueles pneus? Familiares vieram me visitar, primos antigos que eu não via há tempo. Como se todos quisessem ser vistos, talvez pela última vez. É tão chato, tão triste e tão chato, o modo como eles me olham.
Ando dormindo cedo. Ou melhor, deitando-me cedo, remexo-me na cama e salto, em um estalo, como se o mundo fosse explodir na próxima sinaleira. Realmente é difícil dormir, quando se vê tudo apagando durante o dia. Cores cinzas tornam a paisagem mórbida, coloram-se, alternando entre uma claridade estranha e um preto descomunal. Visto qualquer roupa e resolvo sair de casa. É muito cedo, naquela hora que a noite deseja ir embora, mas a luz não é forte o suficiente. Assim como os meus olhos. Droga. Pego a chave do carro e sem pensar saio, encontro meu carro, mas é difícil de entrar, ligo o motor mais por intuição do que por saúde, desbravo a frente de casa e caio na avenida. Quase ninguém passa por lá agora, posso sentir o carro, o motor novo, o barulho, o cheiro de óleo, tudo trabalhando junto. Meus anos de economia para tê-lo. Tudo escuro entre as sinaleiras, não há ninguém agora mesmo, pouca gente na rua. Acredito que não haja problema dar uma última volta.

link do primeiro capítulo: http://contagens.blogspot.com/2008/11/epifanias.html

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Sem samba enredo para mim

Nunca tive uma festa surpresa. Aliás, meus aniversários quase sempre passam batidos. Nascer na época de verão, e ainda por cima perto do Carnaval dá nisso: nenhum dos seus amigos estará por perto e poucos realmente lembrarão. E se esquecerem, é possível entender, afinal há muitos fatores a favor do branco na memória, as férias, a bebida, o calor dos sambas enredos e a folia das festas. Mas nada me incomoda mais do que nunca ter sido surpreendido, uma reunião especial, algo inusitado, um presente escondido, uma situação inesperada. Uma droga de música tocada na janela do meu quarto enquanto eu estive subindo a escada – já posso imaginar a cena. Rafael chegando cansado do trabalho, final de tarde, silêncio. Adentro o lar, e tudo escuro, percorro e não encontro ninguém. Daqui a pouco começam a cantarolar, do nada, “Parabéns pra você...” e surgem as palmas. Depois eu até liberava um samba para comemorar tudo!

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

...ou tarde demais

Ainda era cedo, quando Leonardo acordou para o dia que retornaria a sua casa. O tempo, no sentido de transcendência, não mais existia. O tudo era um vácuo lotado das coisas que poderiam ter acontecido, de pensamentos dissipados por desilusões. Um homem pode continuar a ser homem, quando está preso totalmente sozinho entre quatro muros? Nos últimos anos havia ficado visivelmente mais velho, desgastado pelo ócio rotineiro, acabou prendendo-se em si mesmo, como se os muros montassem em seus ombros, comandassem sua linguagem corporal. Andando sempre contido, sempre estreito e igual, deixou o prédio que tanto habitara durante os últimos trinta anos: sua aposentadoria havia chegado.

domingo, 4 de janeiro de 2009

Mas na minha mente fica atravessando um milhão de coisas

Ah, meus dedos são um saco. Eles não querem se concentrar para escrever nada. Nem um post de blog, nem as matérias para o jornal. E eu tenho tantas idéias! É só ir ao Word, e começar a jogar as benditas letras, formar uma palavra e consequentemente uma frase. Não é tão difícil, eu sei. Mas na minha mente fica atravessando um milhão de coisas diferentes. Lembro, ou invento, que fico com fome, e então vou à cozinha. E nesse momento perco-me criando vontade para ir ao banheiro, ou alguém grita para fazer algo. São tantas coisas acontecendo ao redor, que eu sinto que devo participar de todas elas. Mas isso também soa como uma piada imbecil. Queria me isolar numa bolha e ficar lá dentro apenas acompanhado de um computador com internet, mas sem nada de Orkut, MSN, ou afins. O tempo louco lá fora só me deixou mais doido. 16 graus em pleno Janeiro é piada para os gaúchos. O ruim é que meus dedos não conseguem escrever nem com esse friozinho. O que estará acontecendo?