domingo, 17 de abril de 2011

A tão falada "bagagem cultural"


Não é novidade para ninguém que aumentou o número de brasileiros viajando para o exterior nos últimos anos. Meu objetivo aqui não é dar dados específicos sobre a quantidade de pessoas que viajam e etc, mas o fato é que a economia melhorou e assim a classe média consegue um financiamento maior para dar aos seus filhos aquela tão sonhada viagem. Pode ser um intercâmbio, uma trip em família, ou apenas alguns dias de diversão na Europa.

É claro que não é um fenômeno novo. É natural do ser humano querer viajar, conhecer novos lugares, novas pessoas, manter novas relações para assim conseguir uma “bagagem cultural”. Alguns também pensam no currículo e acreditam que uma estadia em outro País vai ajudar naquela busca pela língua estrangeira, tão necessária para aquele emprego.

Tudo bem.

E é importante também estudar em qualquer outra Universidade do mundo, porque o ensino aqui é pior, e, vocês sabem, brasileiro não tem educação. Ou porque lá sim é que as pessoas têm cultura. É verdade, já cansei de ouvir esses comentários de brasileiros que pretendem viajar, ou já voltaram de viagem. Como se cultura fosse algo adquirível, ou como se pudéssemos comparar duas culturas. Como se o ensino lá fora sempre fosse melhor.

É essa conduta de eternos seres colonizados que nos fazem falar essas besteiras sem cabimento. Não valorizamos os nossos trabalhos, as nossas descobertas, porque é sempre mais fácil culpar o que seria a “corrupção enraizada na nossa sociedade”. É claro, todo político é corrupto, toda pessoa que mora em favela é ladrão. Adoramos generalizar nosso povo, e esquecemos de como se forma o conceito de nação. E é sempre mais fácil reclamar do que tomar uma atitude. Acabamos enlaçados em uma espécie de preguiça programada. Se é muito difícil, não vamos fazer. Peraí tem algo errado. Não são os outros que são melhores que nós, somos nós que não fazemos nada a respeito.

Ao invés de valorizar a nossa história e a nossa vasta e heterogênea cultura queremos viajar para a Europa a fim de tirar as mesmas fotos em frente à Torrei Eiffel. Desejamos tomar um café em Paris, precisamos ir para a Oktoberfest na Alemanha, assistir a uma tourada em Madrid. Porque, você sabe, a vida não valeria a pena sem essas coisas.

Meu Deus do Céu.

Esquecemos de uma palavra muito importante nessa ideia de “bagagem cultural” que adquiríamos em uma trip pela Europa: envolvimento. Há um texto muito interessante do pesquisador Ulpiano de Meneses que versa exatamente sobre essa ideia de turismo cultural, tão em voga, principalmente pelas Agências de Viagem. Em uma sociedade que trata a cultura como um “segmento”, ao invés de tratá-la como uma qualificação capaz de iluminar todo e qualquer segmento, a lógica da separação também acaba determinando a existência de usos e funções culturais específicos. É aí que entra a diferenciação entre uso cultural do bem cultural.

De um modo simples bem cultural é o que é vendido para a pessoa em um pacote de viagem, por exemplo. Há aquela metáfora clássica do grupo de turistas que em visita a uma Catedral Gótica encontram uma velhinha ajoelhada diante do altar-mor, profundamente imersa em oração. O guia então bate em seu ombro e lhe diz – “Minha senhora, vocês está perturbando a visitação”. Essa metáfora é autoexplicativa: a afirmação do guia vem ao encontro da explicação de bem cultural, onde não há espaço para uma prática da existência corrente, como a oração. A anciã está de fato perturbando o agora padrão dominante em que o edifício se tornou. Um exemplar arquitetônico de “interesse cultural”. O envolvimento dos turistas com a Catedral é quase nulo, nada mais do que um interesse fugaz que pode ser registrado em uma foto. Não me diga que você vai conseguir estabelecer uma vida cultural ficando alguns dias em uma cidade. Só terá condição de aprofundar-se quando atingir o o quadro da habitualidade, o que, necessariamente, demanda tempo. É o caso da velhinha que possui uma fruição profunda, vivenciada na qual sua oração envolve não só uma apropriação afetiva mas, sem dúvida, também estética.

O que quero dizer com isso é que há muitos brasileiros preconceituosos com sua própria história, e que preferem visitar outros países esporadicamente apenas para possuir aquela foto que todo mundo tem em seu álbuns de Facebook. Ao invés de se aprofundar no seu País, ao invés de parar de generalizar e manter a sua percepção de povo colonizado. Tudo isso me parece um pouco hipócrita, covarde e ignorante – no sentido básico da palavra.

2 comentários:

Julianne Maia disse...

Eu acho que isso não é um pecado apenas de brasileiros. É comum para jovens de qualquer país viajar e conhecer outros lugares, ter outras vivências aos 20 e poucos anos. Mas concordo contigo que é característico do brasileiro se menosprezar e valorizar o que é de fora. Na real, eu acho muito difícil que alguém se ache mais "culto" porque fez um tour pelo centro de Paris ou conheceu as ruínas do Muro de Berlim. E acho também um privilégio enorme viajar e poder conhecer mundos diferentes. Se for possível estudar e trabalhar no lugar, melhor ainda, nem que seja por um curto período de tempo. Com certeza não torna ninguém mais culto, mas com "bagagem de vida", mais tolerante com as diferenças e histórias pra contar. Beijos!

Anônimo disse...

Realmente o brasileiro tem essa tendência em achat que tudo de fora é melhor, tendo emvista que temos um país lindo para ser explorado, infelizmente de certa forma a mídia tem uma grande parcentual nessa nesse interminável conssumismo.Curti muito seu blog. Parabéns!!!