terça-feira, 25 de novembro de 2008

Quarenta anos na cara

Abri os olhos e encontrei um leão em meu caminho, eu estava no volante, empossado em mim, desvirtuando e coletando cada pensamento do fundo da minha paciência, esmolando sensações, remoendo tudo. Foi quando o vi. Ele dormia, olhos fechados penumbramente, eu já percorria o país há algum tempo, mas nunca havia visto tal criatura, toda majestosa, pêlos alaranjados, batizados pelo sol, encontrava-se sob uma árvore, também, colossal em seu tamanho, com suas folhas pouco presas, todas secas, talvez más sustentadas pela estação. Era uma cena meio poética, meio grosseira, a estrada cortando uma extensão enorme de mar verde, trazendo toda a sujeira da civilização para aquele espaço. O grande animal parecia nem se importar com isso, só dormia quieto e parado, como se pudesse morrer àquela hora mesmo. O outono já chegara, e há dois meses eu começara a viagem. Só eu, os meus pensamentos, o bloco de idéias atirado no porta – luvas, trocados no bolso e, agora, o leão. Quarenta anos na cara e a certeza de que nada é para sempre e de que nada de concreto meu pode ficar para o mundo.

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