Agora a luz está batendo bem de frente na casa. É quase oito
da manhã, e ninguém acordou ainda. A gata malhada escancara a boca, anunciando
o dia. Mas que dia, o que uma gata poderia fazer, que tipo de preocupações
poderiam lhe passar pela cabeça? Ainda mais àquela hora da manhã. É muito cedo
até para uma gata malhada fazer alguma coisa.
Devagar, ela vai andando pela casa, chega a cozinha, aonde
com uma versátil delicadeza, senta alguns instantes. Espera, espera seriamente, mas nada acontece. O seu pequeno rabo agora está esfregando o chão
calmamente, como se fosse natural. Cansada de esperar, ela simplesmente volta a
andar. De repente (do nada mesmo) algum estalo de algum móvel mais antigo
escancara e pronto, ela para mais uma vez, encarando. Como se tudo fosse
horizonte e não houvesse mais nada em volta. Em um segundo está disposta a
correr, perseguindo um barulho. Uma das melhores qualidades dos felinos, atacar
sons, sensações.
Quase palpável, tenta acertar o ruído no ar. Então pula,
girando o corpo e caindo tal qual uma contorcionista. Parece fácil, mas ela é
uma bailarina num chão de cozinha às oito e pouco da manhã. Depois de algumas tentativas, finalmente
desiste, mas não se mostra derrotada – essa não parece ser uma opção. Ao
contrário: segue indiferente, firme, em linha reta. Está quase chegando aonde
deveria, enquanto a manhã corre saborosa, ainda pequena, nunca pronta.
A janela da peça da dispensa estava aberta o tempo todo e o
vento que entrava à noite não impediu ninguém de dormir. Que tipo de
aventuras a malhada poderia encontrar lá fora, aonde tudo parece sempre tão novo
e mutável. Parada em frente a abertura, ela encara o horizonte, mesmo que não saiba exatamente o que está fazendo.
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